quarta-feira, maio 24, 2006

[56 / Cat’s Negativity]

Mas nem tudo foi brilhante. Pelo menos isso foi explícito nos minutos finais do Enterro.
Já tinha nascido o sol. Saí acompanhado de uma amiga de curso, só que houve uma altura em que ela teve de atravessar uma estrada para seguir em direcção ao prédio dela, e eu mantive-me no passeio onde caminhava. À medida que ia reduzindo a distância que me separava de casa, vi que à minha frente seguiam várias pessoas: três rapazes a poucos passos à minha frente e outras pessoas bastante mais avançadas no caminho.
Como estava a andar a um passo mais acelerado que os três rapazes, é natural que os tenha ultrapassado naquela rua com árvores que separa a Universidade do Minho do recinto do Enterro.
Segundos depois constatei que um desses rapazes estava já a caminhar à minha frente. Foi nesse momento que senti um abraço. O meu primeiro pensamento era de que estava a ser abraçado por alguém que me conhece, mas à medida que inclinei a cabeça para olhar para trás, ouvi uma voz masculina irreconhecível. As palavras proferidas pela voz foram “passa”, “para”, “cá”, “a” e “carteira”.
Tornou-se claro. Estava a ser roubado pelo grupo que há segundos atrás tinha ultrapassado.
O abraço nunca o foi. Traduziu-se numa técnica que reduzia a minha mobilidade. Enquanto me debatia, o terceiro elemento retirou-me agilmente a carteira do bolso. Notava-se que havia hábito naqueles gestos. Ainda não tinha começado a dizer que tinha gasto todo o meu dinheiro nas barracas do recinto e já a minha carteira estava aberta, com dois dedos a vasculhar por entre os papéis que lá estavam depositados.
Eles perguntaram pelo dinheiro. E eu continuava a responder que queria a MINHA carteira e que gastei o dinheiro todo nas barracas. Agitava-me de modo a tentar chegar perto dela, mas não conseguia tocar-lhe.
Houve um truque (não intencional) que jogou a meu favor. Não o vou revelar porque não faço ideia de quem algum dia poderá ler estas linhas.
O rapaz que segurava na carteira e procurava pelo dinheiro desistiu de o fazer e devolveu-ma. O rapaz que inicialmente vi a ultrapassar-me nunca me tocou. O rapaz que me tinha agarrado estava agora a dizer-me “Então quero o telemóvel.”.
Levei a mão ao bolso e fiz força para não deixar entrar a mão intrusa.
O revisor da carteira limitou-se a dizer “Deixa-o ir.”. Apesar desta frase mágica, o terceiro elemento não obedeceu e continuava a forçar o meu bolso. Ele estava a ficar para trás porque os outros dois já seguiam caminho à minha frente. Desistiu, não sem antes me tocar com o punho semi-fechado pelo queixo e dizer “Põe-te fino.”.
Passei instantaneamente para o outro lado da estrada e senti-me ridículo por caminhar paralelamente a eles naquela estrada. Dei meia volta e decidi tomar o percurso existente dentro das fronteiras da universidade.
Quando tive oportunidade, olhei para a estrada para tentar memorizar aquelas três caras, só que nunca mais as vi…


E agora pergunto-me: com que legitimidade alguém comete um acto destes? Que frieza tiveram de adquirir para fazer disto um estilo de vida? Não têm noção do impacto que poderiam ter provocado caso eu tivesse maior vulnerabilidade? O que teria acontecido se tivessem escolhido alguém altamente vulnerável? A partir de que momento se deu a viragem entre a fase em que viam os ladrões como pessoas más (certamente já possuíram um dia esta opinião de quem rouba, nem que seja nos tempos de infância em que viam desenhos animados) e o momento em que se dedicaram ao primeiro roubo? O que os leva a ingressar numa actividade tão desprovida de honra e prestígio?
Uma tremenda falta de respeito pelas histórias de vida/sonhos/objectivos/fraquezas/ilusões de quem abordam…

terça-feira, maio 23, 2006

[55 / Cat’s Positivity]

A curva de esquecimento é mesmo inevitável…
Após cada longa noite de Enterro da Gata, acordava e ficava a pensar em todos os pequenos episódios que vivenciei no interior do recinto. Cada um desses episódios fazia com que eu ficasse a sorrir como um parvinho. Eram tantos os sorrisos!...
Hoje tenho a sensação de que notoriamente grande parte desses sorrisos já não existe porque a minha capacidade de evocação acerca dessas fantásticas noites já está numa fase de deterioração. É claro que para este fenómeno de esquecimento, também deve ter contribuído o episódio negativo final (que certamente deve ter ofuscado a evocação de vários episódios positivos, mas isso é outra história que só será englobada no próximo post).
Ainda há fragmentos divertidos memorizados.

fazerem inúmeras propostas de pagamento de bebidas a preços absurdamente baratos
eu próprio tentar pedir shots grátis numa outra barraca, dizendo à rapariga que estava por trás do balcão que eu gostava da maneira como ela se vestia
ter duas irmãs gémeas a suplicarem por dois shots a vinte e cinco cêntimos cada, acabando por serem brindadas com dois shots que incluíam vodka e (muita) cola, para além da cómica troca de frases: “Vocês nunca na vida serão psicólogas!” / “Pois não. Vamos ser economistas!”
uma finalista com uma camisola de curso a dizer “Psicologia Clínica” vem ter comigo à barraca e pede um dos já tradicionais shots a preço de água. Nunca a tinha visto na vida. Disse-lhe que o preço tinha de ser o que estava exposto na tabela. Ela rematou: “Mas eu tirei Psicologia Clínica!!! Não é como vocês, que cá só tiram Psicologia geral! A minha licenciatura é em Psicologia Clínica!! Tu devias ter inveja da minha licenciatura!”. A minha resposta: “Ai é? E onde é que tiraste a licenciatura?”. Ela disse: “Na Gandra!”. Naquele momento, se eu tivesse uma folha a dizer “LOLOLOLOL!”, tinha-a colado certamente na minha testa. Ou talvez mesmo uma das gotas que tenho no meu estojo, feitas em cartolina, para imitar de vez em quando as personagens dos desenhos animados japoneses quando alguém diz uma enorme bacorada. Mas naquela barraca as únicas gotas que eventualmente surgiam eram as que se entornavam dos copos e garrafas com álcool. Limitei-me a explicar-lhe que a Universidade do Minho oferece a melhor licenciatura em Psicologia no país
a minha primeira experiência de tirar um fino foi completamente ridícula. Limitei-me a despejar a cerveja no copo, esquecendo-me de rodar o copo. O resultado é previsível: um copo com muita espuma e pouca cerveja
a primeira vez que me pediram uma bebida menos habitual também foi igualmente inédita. Pediram-me um gin tónico. Peguei num copo, pus gelo e enchi o copo só com gin. O “cliente” aprovou a bebida com satisfação: “Olha. Isto está espectacular!! Só falta uma coisa… Agora põe só um bocadinho de água tónica.”(Acho que é para este tipo de experiências que servem os primeiros turnos de cada pessoa que trabalhou na barraca de Psicologia)
começar a ignorar pedidos de shots grátis, dançando para debaixo do balcão, constatando no entanto que quem queria as "promoções" não se importava de debruçar-se para conseguir continuar a persuadir-me
oferecer um “Psi” (Ψ) do tecto da barraca porque me pediram uma lembrança de Psicologia do Enterro 2006
...aplaudir o facto de a minha amiga Vera ser finalista em Sociologia. Foi um aplauso de parabéns completamente sincero. A recompensa que obtive foi um reconfortante abraço apertado e caloroso que representa a cumplicidade que temos tido desde o nosso tempo de "caloiritos". Para além do abraço, também foi notório que houve a presença de lágrimas femininas pelo facto de este ter sido o último Enterro da Gata da minha antiga geração de sociólogos... (Eu continuarei por cá, Vera... Pelo menos mais um ano.)
ouvir falar de vez em quando do meu profile do Hi5 e do meu blog (A Diana e a Marlene queriam que eu falasse delas aqui, por isso aqui têm o vosso tempo de antena… Hehehe!)
sentir que estava em frente a uma rapariga simpática que me fazia lembrar a Alanis Morissette e que acabou por beber Kalashnikovs sem limão com os amigos
não ter vontade de abandonar o meu turno na noite final quando me apercebi que apenas me restavam dez minutos de trabalho diversão dentro de uma barraca...
...poucos minutos após ter posto a tocar o cd que levei para a barraca com a intenção de ter o privilégio de conhecer as músicas que ouvia enquanto trabalhava, um rapaz apareceu por lá e disse-me: "Parabéns! Acabou de tocar aqui a melhor música de todas as barracas! Continua a pôr na música um desse cd!". Agradeci-lhe e disse que por acaso o cd era meu. Contudo nunca lhe disse que a música número um a que ele se referia, era de facto a música número dois daquele cd (naquela noite apeteceu-me começar com a segunda música)...

(Certamente há muitos mais episódios prestes a assolarem o meu pensamento, por isso nos próximos dias sou capaz de actualizar este post)

terça-feira, maio 16, 2006

[54 / Internal Battle]

O meu corpo tem sido um campo de batalha por parte de microrganismos.
Numa altura em que quase se avista o lado vencedor, fica a noção de que pelos menos três noites do Enterro da Gata já não voltam.
Vou viver a 200% os dias de festa que me restam.

terça-feira, maio 09, 2006

[53 / The Privilege Of Being Given The Chance To Experience A Rushed Heartbeat]

Habituamo-nos tanto à inexistência de relações interpessoais com estranhos que por muito que esse relacionamento seja desejado, simplesmente não encontramos meio de fazer com que ele surja.
No entanto, muitas das vivências que temos são partilhadas com algumas pessoas que por acaso nada nos transmitem. É um paradoxo. Sim. É. Somos forçados a falar com aqueles que pouco nos dizem e forçados a não estabelecer contacto com quem nos transmite uma imagem cativante, mas oficialmente distante. Não há nada que faça com que os nossos caminhos se cruzem e nos levem a ter uma troca de palavras espontânea.
É por isso que aceitamos com grande satisfação cada pequena oportunidade de ficarmos a conhecer mais pormenores sobre as pessoas que secretamente seleccionamos. É por isso que reconhecemos com maior rapidez aquelas faces. É por isso que nos sentimos mais agitados quando estamos em frente a essas faces. É por isso que pensamos nelas frequentemente. É por isso que não queremos acreditar que finalmente chegou o tão aguardado momento de sermos confrontados com a descoberta do profile de uma delas. É por isso que o coração bate descontroladamente quando nos apercebemos de que vamos ser brindados com a informação pessoal dessas pessoas. É por isso que não descansamos enquanto não devorarmos toda a informação que essas pessoas transmitem no profile. É por isso que temos a ânsia de ver/guardar todas as fotos adjacentes. É por isso que tentamos arranjar ideias para fazer com que essas pessoas também se apercebam de que nós próprios temos um profile pronto a ser lido.
É um abanão intenso.


Sentimos verdadeiramente o privilégio de nos conseguirmos "aproximar" daquelas pessoas especiais que infelizmente nos habituamos a ver de perto ao nível geográfico, mas de longe ao nível interactivo. De repente deixam de habitar o mundo dos nossos pensamentos para aparecerem sem aviso prévio no nosso ecrã.
Conseguimos, por momentos, sentir que deixaram de ser tão incógnitas. Aceder àquela imagem física que sempre quisemos ter à nossa frente a qualquer hora. Rever essas faces através de um ponto de vista incrivelmente próximo. Ouvir-lhes o fervilhar das ideias. Ver aquele olhar estático mas intenso a fixar o nosso. Tocar-lhes na pele a que agora temos acesso visual e intemporal. Sentir-lhes a respiração. Apreciar o beijo silencioso.
Tudo isto de uma forma virtual…

terça-feira, maio 02, 2006

[52 / By Request]

Devido à pertinenência de uma questão que me foi colocada num comment, aqui vai a resposta: não gosto da palavra discoteca porque me remete para um ambiente completamente retro (anos 80)...
Soa a uma palavra completamente contextualizada naquela época desactualizada...
Acho que quem opta por chamar outros nomes às discotecas, se sai sempre bem.
Club é um bom exemplo.