Mas nem tudo foi brilhante. Pelo menos isso foi explícito nos minutos finais do Enterro.
Já tinha nascido o sol. Saí acompanhado de uma amiga de curso, só que houve uma altura em que ela teve de atravessar uma estrada para seguir em direcção ao prédio dela, e eu mantive-me no passeio onde caminhava. À medida que ia reduzindo a distância que me separava de casa, vi que à minha frente seguiam várias pessoas: três rapazes a poucos passos à minha frente e outras pessoas bastante mais avançadas no caminho.
Como estava a andar a um passo mais acelerado que os três rapazes, é natural que os tenha ultrapassado naquela rua com árvores que separa a Universidade do Minho do recinto do Enterro.
Segundos depois constatei que um desses rapazes estava já a caminhar à minha frente. Foi nesse momento que senti um abraço. O meu primeiro pensamento era de que estava a ser abraçado por alguém que me conhece, mas à medida que inclinei a cabeça para olhar para trás, ouvi uma voz masculina irreconhecível. As palavras proferidas pela voz foram “passa”, “para”, “cá”, “a” e “carteira”.
Tornou-se claro. Estava a ser roubado pelo grupo que há segundos atrás tinha ultrapassado.
O abraço nunca o foi. Traduziu-se numa técnica que reduzia a minha mobilidade. Enquanto me debatia, o terceiro elemento retirou-me agilmente a carteira do bolso. Notava-se que havia hábito naqueles gestos. Ainda não tinha começado a dizer que tinha gasto todo o meu dinheiro nas barracas do recinto e já a minha carteira estava aberta, com dois dedos a vasculhar por entre os papéis que lá estavam depositados.
Eles perguntaram pelo dinheiro. E eu continuava a responder que queria a MINHA carteira e que gastei o dinheiro todo nas barracas. Agitava-me de modo a tentar chegar perto dela, mas não conseguia tocar-lhe.
Houve um truque (não intencional) que jogou a meu favor. Não o vou revelar porque não faço ideia de quem algum dia poderá ler estas linhas.
O rapaz que segurava na carteira e procurava pelo dinheiro desistiu de o fazer e devolveu-ma. O rapaz que inicialmente vi a ultrapassar-me nunca me tocou. O rapaz que me tinha agarrado estava agora a dizer-me “Então quero o telemóvel.”.
Levei a mão ao bolso e fiz força para não deixar entrar a mão intrusa.
O revisor da carteira limitou-se a dizer “Deixa-o ir.”. Apesar desta frase mágica, o terceiro elemento não obedeceu e continuava a forçar o meu bolso. Ele estava a ficar para trás porque os outros dois já seguiam caminho à minha frente. Desistiu, não sem antes me tocar com o punho semi-fechado pelo queixo e dizer “Põe-te fino.”.
Passei instantaneamente para o outro lado da estrada e senti-me ridículo por caminhar paralelamente a eles naquela estrada. Dei meia volta e decidi tomar o percurso existente dentro das fronteiras da universidade.
Quando tive oportunidade, olhei para a estrada para tentar memorizar aquelas três caras, só que nunca mais as vi…
E agora pergunto-me: com que legitimidade alguém comete um acto destes? Que frieza tiveram de adquirir para fazer disto um estilo de vida? Não têm noção do impacto que poderiam ter provocado caso eu tivesse maior vulnerabilidade? O que teria acontecido se tivessem escolhido alguém altamente vulnerável? A partir de que momento se deu a viragem entre a fase em que viam os ladrões como pessoas más (certamente já possuíram um dia esta opinião de quem rouba, nem que seja nos tempos de infância em que viam desenhos animados) e o momento em que se dedicaram ao primeiro roubo? O que os leva a ingressar numa actividade tão desprovida de honra e prestígio?
Uma tremenda falta de respeito pelas histórias de vida/sonhos/objectivos/fraquezas/ilusões de quem abordam…
Já tinha nascido o sol. Saí acompanhado de uma amiga de curso, só que houve uma altura em que ela teve de atravessar uma estrada para seguir em direcção ao prédio dela, e eu mantive-me no passeio onde caminhava. À medida que ia reduzindo a distância que me separava de casa, vi que à minha frente seguiam várias pessoas: três rapazes a poucos passos à minha frente e outras pessoas bastante mais avançadas no caminho.
Como estava a andar a um passo mais acelerado que os três rapazes, é natural que os tenha ultrapassado naquela rua com árvores que separa a Universidade do Minho do recinto do Enterro.
Segundos depois constatei que um desses rapazes estava já a caminhar à minha frente. Foi nesse momento que senti um abraço. O meu primeiro pensamento era de que estava a ser abraçado por alguém que me conhece, mas à medida que inclinei a cabeça para olhar para trás, ouvi uma voz masculina irreconhecível. As palavras proferidas pela voz foram “passa”, “para”, “cá”, “a” e “carteira”.
Tornou-se claro. Estava a ser roubado pelo grupo que há segundos atrás tinha ultrapassado.
O abraço nunca o foi. Traduziu-se numa técnica que reduzia a minha mobilidade. Enquanto me debatia, o terceiro elemento retirou-me agilmente a carteira do bolso. Notava-se que havia hábito naqueles gestos. Ainda não tinha começado a dizer que tinha gasto todo o meu dinheiro nas barracas do recinto e já a minha carteira estava aberta, com dois dedos a vasculhar por entre os papéis que lá estavam depositados.
Eles perguntaram pelo dinheiro. E eu continuava a responder que queria a MINHA carteira e que gastei o dinheiro todo nas barracas. Agitava-me de modo a tentar chegar perto dela, mas não conseguia tocar-lhe.
Houve um truque (não intencional) que jogou a meu favor. Não o vou revelar porque não faço ideia de quem algum dia poderá ler estas linhas.
O rapaz que segurava na carteira e procurava pelo dinheiro desistiu de o fazer e devolveu-ma. O rapaz que inicialmente vi a ultrapassar-me nunca me tocou. O rapaz que me tinha agarrado estava agora a dizer-me “Então quero o telemóvel.”.
Levei a mão ao bolso e fiz força para não deixar entrar a mão intrusa.
O revisor da carteira limitou-se a dizer “Deixa-o ir.”. Apesar desta frase mágica, o terceiro elemento não obedeceu e continuava a forçar o meu bolso. Ele estava a ficar para trás porque os outros dois já seguiam caminho à minha frente. Desistiu, não sem antes me tocar com o punho semi-fechado pelo queixo e dizer “Põe-te fino.”.
Passei instantaneamente para o outro lado da estrada e senti-me ridículo por caminhar paralelamente a eles naquela estrada. Dei meia volta e decidi tomar o percurso existente dentro das fronteiras da universidade.
Quando tive oportunidade, olhei para a estrada para tentar memorizar aquelas três caras, só que nunca mais as vi…
E agora pergunto-me: com que legitimidade alguém comete um acto destes? Que frieza tiveram de adquirir para fazer disto um estilo de vida? Não têm noção do impacto que poderiam ter provocado caso eu tivesse maior vulnerabilidade? O que teria acontecido se tivessem escolhido alguém altamente vulnerável? A partir de que momento se deu a viragem entre a fase em que viam os ladrões como pessoas más (certamente já possuíram um dia esta opinião de quem rouba, nem que seja nos tempos de infância em que viam desenhos animados) e o momento em que se dedicaram ao primeiro roubo? O que os leva a ingressar numa actividade tão desprovida de honra e prestígio?
Uma tremenda falta de respeito pelas histórias de vida/sonhos/objectivos/fraquezas/ilusões de quem abordam…