Quando reparo num topógrafo nas ruas, vejo-me obrigado a procurar o outro topógrafo. É algo a que não consigo resistir. Às vezes bem tento olhar disfarçadamente para o local onde está direccionada a máquina do primeiro topógrafo, mas nem sempre consigo encontrar o segundo.
Estes episódios são fácil e especialmente transferíveis para as discotecas (I hate this word). Refiro-me a vários aspectos:
_ a facilidade com que nós próprios reparamos no interesse que temos por pessoas específicas; tornamo-nos topógrafos prontos a estabelecer contacto visual com outra pessoa;
_ a dificuldade com que a outra pessoa se apercebe que se está a tornar topógrafa: de repente nota que há alguém que olha bastantes vezes para ela, mas não consegue decifrar qual a intensidade/superficialidade do interesse da pessoa inicial;
_ a dificuldade com que conseguimos detectar outros topógrafos na discoteca.
O primeiro aspecto envolve exclusivamente a nossa atracção pessoal, pelo que não nos é nada difícil adivinhar quais seriam as nossas opções na selecção de colegas de trabalho topográfico.
O segundo, nos casos em que o alvo da selecção somos nós, pode envolver bastante coragem por parte da(s) outra(s) pessoa(s), dado que podemos aperceber-nos do interesse alheio através de métodos muito diversos. A divergência nestes métodos é da exclusiva responsabilidade da(s) outra(s) pessoa(s), dado que diferentes tipos de abordagem podem requerer níveis de coragem idênticos, consoante as pessoas. Assim, a “ousadia” de um ser humano fixar o olhar em alguém e deixar-se apanhar repetidamente nessa actividade, pode ser equivalente à ousadia de outro ser humano quando decide tentar estabelecer uma conversa, tendo como objectivo principal obter um nome ou um número de telefone. Por seu lado, alguém que arrisque um beijo, pode sentir o mesmo nível de insegurança/desconforto que a pessoa que está a tentar estabelecer o contacto visual inicial.
O último aspecto é, a meu ver, o mais interessante de todos. Ele ocorre quando nos alheamos desta nossa profissão forçada e tentamos detectar o trabalho exercido pelos outros. De vez em quando temos indícios de que amigos nossos estão interessados em alguém que está por perto, mas não conseguimos fazer ideia de quem seja, a não ser que nos digam quem é. Mas isso nem sempre acontece. E quando tentamos observar estes padrões em pessoas que não conhecemos? Torna-se tudo ainda mais complexo.
Não detectamos receios e incertezas realistas por parte dos topógrafos que estão em nosso redor. Não conseguimos encontrar os olhares cruzados, mas o facto é que eles devem estar a ocorrer durante as nossas distracções. Não avistamos a evolução dos comportamentos que a cada momento tendem a tornar-se mais notórios. Não nos apercebemos da desilusão que um gesto errado pode provocar no outro topógrafo.
Todo o trabalho parece ser feito na clandestinidade, até que de repente a interacção corporal (bem) explícita torna oficialmente visível o processo que tinha estado camuflado. Normalmente esta visibilidade só ocorre quando o comportamento é socialmente irreversível, tal como é o caso da conversa ou de um beijo.
E enquanto nos debruçamos sobre os interesses imperceptíveis das pessoas que estão ao nosso lado, não fazemos a mínima ideia do quão disseminado este fenómeno está, debaixo daquele tecto onde as pessoas dançam e se observam. Não imaginamos a quantidade e diversidade de topógrafos que nos rodeiam. Não sabemos quando é que estamos a impedir fisicamente a troca desses olhares (quer distraindo um dos topógrafos, quer colocando-nos acidentalmente entre eles os dois - é nestes momentos que nos tornamos lixo visual para os dois topógrafos que tentam a todo o custo arranjar um novo local estratégico). Nem sequer temos consciência de que se existisse um fio de conexão entre cada olhar que se cruza interessadamente, estaríamos certamente envolvidos num casulo gigante.
Estes episódios são fácil e especialmente transferíveis para as discotecas (I hate this word). Refiro-me a vários aspectos:
_ a facilidade com que nós próprios reparamos no interesse que temos por pessoas específicas; tornamo-nos topógrafos prontos a estabelecer contacto visual com outra pessoa;
_ a dificuldade com que a outra pessoa se apercebe que se está a tornar topógrafa: de repente nota que há alguém que olha bastantes vezes para ela, mas não consegue decifrar qual a intensidade/superficialidade do interesse da pessoa inicial;
_ a dificuldade com que conseguimos detectar outros topógrafos na discoteca.
O primeiro aspecto envolve exclusivamente a nossa atracção pessoal, pelo que não nos é nada difícil adivinhar quais seriam as nossas opções na selecção de colegas de trabalho topográfico.
O segundo, nos casos em que o alvo da selecção somos nós, pode envolver bastante coragem por parte da(s) outra(s) pessoa(s), dado que podemos aperceber-nos do interesse alheio através de métodos muito diversos. A divergência nestes métodos é da exclusiva responsabilidade da(s) outra(s) pessoa(s), dado que diferentes tipos de abordagem podem requerer níveis de coragem idênticos, consoante as pessoas. Assim, a “ousadia” de um ser humano fixar o olhar em alguém e deixar-se apanhar repetidamente nessa actividade, pode ser equivalente à ousadia de outro ser humano quando decide tentar estabelecer uma conversa, tendo como objectivo principal obter um nome ou um número de telefone. Por seu lado, alguém que arrisque um beijo, pode sentir o mesmo nível de insegurança/desconforto que a pessoa que está a tentar estabelecer o contacto visual inicial.
O último aspecto é, a meu ver, o mais interessante de todos. Ele ocorre quando nos alheamos desta nossa profissão forçada e tentamos detectar o trabalho exercido pelos outros. De vez em quando temos indícios de que amigos nossos estão interessados em alguém que está por perto, mas não conseguimos fazer ideia de quem seja, a não ser que nos digam quem é. Mas isso nem sempre acontece. E quando tentamos observar estes padrões em pessoas que não conhecemos? Torna-se tudo ainda mais complexo.
Não detectamos receios e incertezas realistas por parte dos topógrafos que estão em nosso redor. Não conseguimos encontrar os olhares cruzados, mas o facto é que eles devem estar a ocorrer durante as nossas distracções. Não avistamos a evolução dos comportamentos que a cada momento tendem a tornar-se mais notórios. Não nos apercebemos da desilusão que um gesto errado pode provocar no outro topógrafo.
Todo o trabalho parece ser feito na clandestinidade, até que de repente a interacção corporal (bem) explícita torna oficialmente visível o processo que tinha estado camuflado. Normalmente esta visibilidade só ocorre quando o comportamento é socialmente irreversível, tal como é o caso da conversa ou de um beijo.
E enquanto nos debruçamos sobre os interesses imperceptíveis das pessoas que estão ao nosso lado, não fazemos a mínima ideia do quão disseminado este fenómeno está, debaixo daquele tecto onde as pessoas dançam e se observam. Não imaginamos a quantidade e diversidade de topógrafos que nos rodeiam. Não sabemos quando é que estamos a impedir fisicamente a troca desses olhares (quer distraindo um dos topógrafos, quer colocando-nos acidentalmente entre eles os dois - é nestes momentos que nos tornamos lixo visual para os dois topógrafos que tentam a todo o custo arranjar um novo local estratégico). Nem sequer temos consciência de que se existisse um fio de conexão entre cada olhar que se cruza interessadamente, estaríamos certamente envolvidos num casulo gigante.